quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Invisível

O teu eu é como o meu, mas sem voz. Olhos que brilham no escuro de uma imaginação abarrotada de lembranças. Foi um grande prazer e sempre será, meu amigo.
O teu sorriso é como o meu, mas congelado. Vive naquela tela estática, irreal e nada lúcida. Você se tornou parte dessa loucura incompleta, desse jogo sem peças, mas com xeque-mate cada vez mais próximo. Eu não sei muito bem em que momento de toda essa história você derrubou a minha pose de rainha com seu cavalo bem-humorado e gentil.
Eu não posso te enxergar, mas te vejo. Que irreal desejo é esse que me assombra? Quando meus olhos se fecham e aquela única brecha de luz se acende, eu sei, é você em qualquer parte do mundo, em qualquer cama que eu não sei a temperatura, com qualquer roupa que eu não sei a cor. É você em cada mania que eu desconheço, em cada rotina que eu me enfio como uma íntima estranha.
Eu não posso te escutar, mas te ouço. E que voz é essa que ecoa de um passado já tão distante? As palavras que você diz sorriem para o meu tímido silêncio. A gente encontrou esse modo torto de se entender pelas mãos. E sorrir com as mãos vai ser sempre a nossa maior voz.
Eu amo as suas visitas, mas talvez não devesse abrir as portas da minha casa dessa forma e te convidar para entrar, para visitar os meus armários e te servir as sobras de uma refeição já feita. Você merecia não menos que um jantar à luz de velas, com um bom abraço de sobremesa. O que eu posso te oferecer é tão pouco perto do que eu possuo guardado no fundo do meu mais íntimo pensamento.
Redescobri o tom, mas não redesenhei as metas. Você é feito desenho em nuvem: talvez seja só coisa-da-minha-cabeça-ociosa. A verdade é que, desde você, sou eu de novo. Com aquele perigoso brilho latente nos olhos; farol alto demais nessa estrada que já parecia tão iluminada. O problema é que, desde você, já não sou mais eu. Não aquela pessoa centrada e objetiva. Ando cheia de subjetividades tenebrosas, ilegais. Sou risco o tempo inteiro, inconstância. Ora certeza invicta e eterna, ora efemeridade tentadora.

- Mariana Stofel.


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